Na manhã do primeiro dia dos ázimos, quinta-feira, estando todos em Betânia, os discípulos perguntaram ao Mestre onde ele queria que lhe preparasse a Ceia da Páscoa.
A Páscoa era a festa mais importante de Israel, o centro da festa era a Ceia Pascoal, que devia se realizar segundo umas prescrições minuciosamente detalhadas, e seriam rigorosamente cumpridas por Jesus e seu grupo. Sobre este cenário pascoal o Pobre realizaria nesta noite das noites a mais fantástica manifestação de mistérios.
A tarde vai caindo, os discípulos oscilam entre o temor e o gozo pascoal. Qualquer tentativa de descrever o interior do Pobre seria um esforço inútil.
– Companheiros de minha solidão e de meu desterro, creio na beleza da dor quando é impregnada de amor. Creio na compaixão última quando assume a carga da humanidade sofredora.
Os discípulos permaneceram em silêncio, sem entender exatamente o significado das palavras.
Brilhavam as primeiras estrelas. O Mestre e seus discípulos já estavam no Cenáculo, sentados em esteiras de palhas. Não era um ambiente idílico, mas uma atmosfera carregada de tensão, cruzada por vários feixes de luz, que iluminariam a noite com resplendores avermelhados: o lava-pés, a instituição da Eucaristia, o anúncio da traição de Judas e a negação de Pedro, o testamento do amor, a despedida… eram como espadas contraditórias cruzadas, formando uma trama francamente dramática.
O Pobre de Nazaré tinha saltado das alturas do Pai para o se de sua santa Mãe. Mas havia chegado o momento de partir de novo para o Pai. Só tinha feito uma coisa durante a travessia: amar. E agora, no fim e sua vida, dispunha-se a lançar sua suprema ofensiva de amor.
Jesus lhe disse: – Desde as profundidades do meu ser quero lhes falar esta noite e quisera que minhas palavras fossem ecos de eternidade. Meus filhos, eu me vou. Se não saltarmos no precipício, não nos nascerão asas. Devo submergir-me em um banho e depois disso haverá um prodígio: a dor ter-se-á transformado em amor e o amor levantará as muralhas do Reino. Despeço-me. Não vou cear mais com vocês até o dia do grande banquete do Reino. Mas, antes de ir, quero constituir-me como companheiro eterno e amigo inseparável de todos os homens até o fim do mundo.
E além disso – concluiu – esta é a última das ceias que celebramos ao longo de nossa aventura apostólica e a primeira de todas as ceias que, em minha ausência e minha memória, haverão de ser celebradas até o fim do mundo, como sinal de unidade e vínculo de fraternidade: os que comerem de um mesmo pão deverão ter um só coração; os que se sentarem à mesma mesa deverão constituir uma mesma família. Tomem e comam: este é meu corpo, entregue por vocês. Façam isso em memória de mim.
Extraído do livro “O Pobre de Nazaré” de Frei Ignácio Larrañaga OFM