Sofrer com Jesus
O sofrimento de Cristo, aceito com amor, como expressão da vontade do Pai, gerou um bem supremo: a Redenção do mundo. E, embora seja verdade que este bem é infinito e nenhum homem pode acrescentar-lhe nada, contudo, Jesus Cristo quis deixar aberta sua própria dor redentora a qualquer sofrimento humano, com a condição que seja assumida com amor.
Essa Redenção, ao mesmo tempo completa e sempre aberta, nos introduz no mistério essencial da Igreja, o Corpo de Cristo. É o marco e o espaço onde se completa o que falta aos padecimentos do Senhor, como diz Paulo.
Somos membros de uma sociedade especial na qual ganhamos em conjunto e perdemos em conjunto. Essa sociedade é como um corpo que tem muitos membros, os quais, em conjunto, formam uma unidade.
Mas há muito mais. Diz Paulo: “Se um membro tem um sofrimento, todos os demais membros sofrem com ele”. Eis aí a questão. Machucando a unha do dedinho, é possível que a febre se apodere de todo corpo. Todos os membros sofrem as consequências. Por que o joelho tem de sofrer as consequências do dedinho? Porque ganhamos em conjunto e perdemos em conjunto. Perdeu o dedinho, perderam todos os membros. Sarou o dedinho, sararam todos os membros. Da mesma forma, no Corpo de Igreja, existe uma intercomunicação de lucros e perdas, de graça e pecado.
Dado esse mistério, você não pode perguntar: “Por que tenho de sofrer as consequências dos pecados de u drogado ou de um fraudador de outro país? O que tenho a ver com eles? ”. Tem muito a ver porque todos os batizados do mundo estão misteriosamente intercomunicados. Se você ganha, ganha toda Igreja; se você perde, perde toda a Igreja.
Essa doutrina é uma continuação, ampliação e aperfeiçoamento daquela intuição do profeta Isaias sobre o servo de Javé, figura cativante e sofredora, sobre cujos ombros o Senhor colocou todos os nossos crimes. Foi ferido pelos delitos de seu povo, foi vítima de nossos excessos, e os desvios dos homens provocaram seu martírio.
Em suma, o servo está sofrendo pelos demais. Ele ocupou o lugar dos pecadores e assumiu o sofrimento que deveria ter recaído sobre eles; suas cicatrizes nos curaram. O servo desceu, silencioso, ao abismo da morte porque estava expiando os pecados alheios.
Sobre esse pano de fundo, a catequese primitiva interpretou o acontecimento do Calvário. Escondida entre as dobras mais recônditas do coração humano, palpita uma vocação de solidariedade, instintiva e congênita, para com a humanidade sofredora e pecadora.
Este panorama oferece ao cristão que sofre centelhas de luz, pistas de orientação, horizontes abertos e, sobretudo, um caminho de luz para sua vida cotidiana. Em cero sentido, podemos dizer que a dor foi vencida ou que, pelo menos, perdeu seu mais temível aguilhão: a falta de sentido.
Estou certo de que hoje em dia vivem entre nós incontáveis servos de Javé que sofrem pelos demais e que colaboram com Cristo na Redenção do mundo. Assim como a comunidade primitiva não encontrou outra explicação para o desastre do Calvário, tampouco nós encontramos outra lógica que explique a paixão e a morte de tantas pessoas nos dias de hoje, a não ser a figura misteriosa do servo de Javé que carrega sobre si os sofrimentos alheios e sofre pelos demais. Tenho visto, e estou vendo, inúmeras vezes, como se repete e se vive diariamente o mistério do servo sofredor que padece pelos demais.
Tirado do livro: ”A arte de ser feliz” capítulos VI item: “Redimir com Cristo” de Frei Ignacio Larrañaga.