Entramos aqui em um dos capítulos mais desconcertantes de Deus: sua essencial gratuidade. Em consequência suas iniciativas de graça para conosco serão imprevisíveis. E, como primeira medida, precisamos de muita paciência em nosso trato com Deus.
As emoções são dádivas que o Pai oferece de vez em quando. Mas dádiva não se merece, nem se conquista, nem se alcança, nem sequer se pede. Recebe-se. Gratuitamente se dá e gratuitamente se recebe.
Dizem que a paciência é a arte de esperar. Prefiro pensar que é a arte de saber, porque o que se sabe se espera.
Mas, saber o quê? Que Deus e nós estamos em órbitas diferentes. Entre nós em nossas relações humanas, funcionam as leis da proporcionalidade: a tal causa, tal efeito; a tanta ação tanta reação; a tanto trabalho, tal salário. Cálculos de probabilidades, constantes psicológicas…
Na vida com Deus não funcionam estas leis. No momento em que menos se pensa, ocorre-lhe pagar o mesmo salário ao que trabalhou dez horas e ao que trabalhou duas horas. Ninguém pode questioná-lo, perguntando-lhe: “Onde está a justiça distributiva ou a lei da proporcionalidade?”.
O Senhor por certo vai nos responder: “Meus filhos, não podeis questionar-me fazendo semelhantes perguntas, porque o que dei ao que trabalhou dez horas, ou o que dei ao que trabalhou duas, não foi salário, mas dádiva que lhes fiz, e, do que é meu, posso fazer o que considerar conveniente. Além disso, neste meu Reino nada se paga, porque tudo se ganha; nada se premia, porque nada se merece. Neste meu Reino, está em circulação apenas um verbo, o verbo dar, Tudo é dom e tudo é dádiva; e circula em vossa órbita apenas um verbo, o receber, tudo é mercê e gratuidade”.
As palavras de Deus na Bíblia soam até a capricho: “Faço graça a quem faço graça, tenho misericórdia de quem tenho misericórdia”. É maneira de expressar-se aparentemente simplista, sendo, porém, no fundo, genial quando se trata de definir a gratuidade. A gratuidade é assim sem pé nem cabeça, sem lógica, nem previsão. Os que me buscam me encontrarão, mas não quando quiserem ou da maneira que quiserem.
Tomas a decisão de fazer um “deserto”: cinco horas de silêncio e solidão com o Senhor, metido no coração da natureza. As primeiras quatro horas foram de aridez e secura, e nos últimos quarenta e cinco minutos fez-se presente o Senhor com todo peso de sua gloria.
Em outro “deserto”. Durante a primeira hora tiveste uma inundação divina em um mar de gozo, sendo, ao invés, as horas restantes, pura fadiga e aridez.
Fizeste um retiro clássico de seis dias, e foram seis dias de sonolência e fastio. E na quinta-feira da semana seguinte, ao andar pelo supermercado, quando compravas verduras, o Senhor se fez presente a ti com tal resplendor que te deixou deslumbrado por todos os dias de tua vida…
Ele é assim desconcertante, imprevisível, precisamente por ser gratuidade. É preciso ter muita paciência com Deus. Os que O buscam por certo o encontrarão, mas não quando querem, ou da maneira como querem.
Os que quiserem levar Deus a sério, preparem-se para sentar-se pacientemente diante dos umbrais de sua porta à espera de seus silêncios, ausências e demoras.
Deus toma uma pessoa e leva-a, por toda vida, por áridas areias como de um deserto. Toma outra pessoa e a conduz por mares de ternura. Toma outra e se lhe faz presente, no meio da vida, com uma daquelas “visitações” que lhe deixam marcas profundas na existência. Toma outra, e não lhe dá nada disso, mas infunde sensibilidade divina tão grande, que não pode mais viver sem Deus. Toma outra e concede-lhe constância tão firme que a mantém fiel até a morte. Ele não se repete! Para cada um tem sua pedagogia, e essa vai variando segundo normas que desconhecemos inteiramente.
Os que querem levar Deus a sério, preparem-se para ficar de pé com paciência ardorosa, sabendo e aceitando de entrada que Ele é assim: desconcertante e imprevisível, precisamente por sua essencial gratuidade.
Paciência! A arte de saber e aceitar em paz que não necessariamente a nossos esforços por busca-Lo corresponderá a graça de encontra-Lo, que não necessariamente os resultados serão proporcionais aos esforços, que não existem constantes psicológicas nem leis de proporcionalidade, que aqui tudo é imprevisível e desconcertante pelo simples fato Dele ser assim: pura gratuidade!
Vai-se perdendo a fé com tudo isso, enquanto vai comentando: isso parece irracional, estamos perdendo tempo, não vale a pena… E acaba abandonando tudo.
Por não saber que não necessariamente a nossos esforços por buscá-Lo corresponderá a graça de encontrá-Lo. Por não saber e aceitar em paz que não necessariamente os resultados serão proporcionais aos esforços. Por não saber e aceitar com paz que Ele é assim: pura gratuidade. Em suma, por não ter paciência.
Extraído do livro “Itinerário rumo a Deus”, de Frei Ignácio Larrañaga, OFM